Gibb, Eddie. “Contos de uma mãe solteira”. The Sunday Times, 29 de junho de 1997.

Primeiro, um estereótipo. A autora de livros infantis veste Laura Ashley, faz sua própria marmelada no seu fogão a gás e dirige um Volvo que a transporta de um projeto assustadoramente interessante para o próximo. Escreve suas próprias histórias encantadoras preenchendo o tempo entre o almoço com as amigas e ir buscar as crianças na escola.

Agora outro estereótipo: a mãe solteira e desempregada vive com seu bebê em uma quitinete porque era tudo o que ela podia pagar com a ajuda do governo. Embora ela fosse adorar achar um emprego, os custos de uma creche absorveriam qualquer extra que ela recebesse. Ela acha que vai enlouquecer se nada mudar logo.

Joanne Rowling é tanto uma escritora de livros infantis quanto uma mãe solteira, e até recentemente sua vida estava mais para quitinete do que para cozinha campestre. Mas alguma coisa mudou: seu primeiro livro acabou de ser publicado. A crítica do mercado literário britânico para Harry Potter e a Pedra Filosofal é extremamente positiva, a Scholastic American Publishing House acabou de comprar os direitos por uma soma que Rowling admite ter passado de US$100.000 (algumas fontes dizem que pode ser tanto quanto US$500.000). Este é um belo avanço para qualquer iniciante, mas é inédito para um escritor infantil. O fogão a gás e o Volvo agora estão ao seu alcance.

Para Rowling, 31, tem sido uma labuta de sete anos escrevendo o livro enquanto se casou e separou-se de um jornalista televisivo português, teve filho e lidou com a morte de sua mãe. “Eu senti, antes do livro ser publicado, que ele salvou minha sanidade, ele realmente o fez”, ela diz. “Eu voltei de Portugal sem emprego e sem lugar para morar. Eu escrevia furiosamente enquanto minha filha estava dormindo, o que não só me dava algo para fazer como era um escape pra mim, também. Por mais banal que pareça, se o livro nunca tivesse sido publicado, ele ainda teria uma importância enorme na minha vida porque ele me deu um lugar para ir além de um apartamento onde eu me sentia prisioneira”.

Rowling foi criada na Floresta de Dean, na fronteira de Gales, mas quando voltou à Inglaterra anos atrás, ela veio para Edimburgo, onde sua irmã e sua avó moravam. Nos primeiros seis meses ela ficou presa na armadilha do benefício que dificulta para qualquer mãe solteira arrumar um emprego. Quando sua filha Jessica (agora com quase quatro anos) tinha idade suficiente, Rowling se registrou no curso superior de professores e no último ano tem sido professora substituta de francês na Academia Leith. Ela completou sua primeira história quando tinha seis anos, e tem duas “bí­blias” inacabadas de “péssima” ficção adulta guardada em uma gaveta.

“Eu nunca esperei ganhar dinheiro”, ela diz. “Eu sempre vi Harry Potter como um livrinho ardiloso. Eu gostava e trabalhava duro nele, mas nunca nos meus melhores sonhos eu imaginei grandes avanços”. O que o dinheiro significará para ela? “Em termos práticos ele significará segurança. Nós temos nos virado, mas tem sido difícil em algumas ocasiões. Eu não quero ser dramática – nós não passamos fome nem nada, mas pais solteiros nunca ficam ricos. É surpreendente que algo que você fez valha tanto dinheiro para outra pessoa, mas então eu olho para minha filha e penso: graças a Deus que sim”.

Embora Rowling tenha escrito por anos, ela tem um dia de pagamento criativo com o personagem chamado Harry Potter. Ele é um órfão criado por seus tios desagradáveis em um subúrbio anônimo do interior. Seu próprio filho é um mimado insuportável, exigindo dois quartos para guardar todos os seus brinquedos, enquanto Harry dorme no armário de vassouras embaixo da escada. Mas Harry tem poderes estranhos que ninguém entende até que ele descobre que é um bruxo.

Em uma época de Nintendo e Teletubbies (do qual Jessica é fã), Harry Potter e a Pedra Filosofal parece um livro infantil escrito há 20 anos. Apontado que o grupo de idade entre 9 e 13 anos é essencialmente leitor de livros escolares, esse cenário se tornou fora de moda. “Tinha que se passar em uma escola para sustentar a fantasia”, Rowling diz. “Ele tinha que ir a algum lugar com um mundo escondido para viver suas aventuras. Crianças são inacreditavelmente sem poderes porque tudo é determinado para elas, então uma vida fantástica onde eles tenham poder é quase inevitável. E um internato de classe média é um mundo onde eles estão livres dos pais. Ser um órfão é muito libertador em um livro. Eu acho que é uma fantasia muito comum em crianças que aqueles pais não são os seus verdadeiros pais”.

Como se o processo de escrever o livro oferecesse um escape de sua rotina, Rowling percebeu mais tarde que o livro tinha sido influenciado pela morte de sua própria mãe. Rowling escreveu um capítulo onde Harry Potter vê seus pais em um espelho mágico após a morte deles. “As pessoas disseram que é um capítulo muito sombrio, mas eu não acho que ele estaria lá se eu não tivesse perdido minha mãe enquanto eu estava escrevendo o livro”, diz Rowling. “Eu daria quase tudo para passar mais cinco minutos com minha mãe, o que, obviamente, nunca seria suficiente”.

Com o segundo livro de Harry Potter a ser entregue para os editores esse mês, Rowling tentou escrever um final feliz para si mesma. Talvez os bons tempos façam as memórias tristes mais fáceis de lidar.

Traduzido por: Patricia Monteiro Domingues de Abreu.
Revisado por: Isadora Cal em 18/10/2009.
Postado por: Patricia Monteiro Domingues de Abreu.
Entrevista original no Accio Quote aqui.