Carrell, Severin. “Mídia: Harry Potter e a Horrível Hackette*; qual entrevistador inspirou o venenoso personagem do último bestseller de J.K. Rowling? Severin Carrell especula prováveis suspeitos.” The Independent (Londres), 05 de setembro de 2000.

No Festival do Livro de Edimburgo da semana passada, uma criança perguntou à autora infantil mais popular do ocidente sobre uma nova personagem do seu último livro. A personagem era alguém particularmente desonesto, astuto, falso e, às vezes, mau. Alguém que usa sua posição profissional para ganhar pontos para si mesmo. Alguém que inventa citações.

Aquela criança provavelmente não é a única pessoa que gostaria de perguntar a Joanne Rowling sobre as origens daquele personagem, uma jornalista que se exalta na assinatura de Rita Skeeter. Estas pessoas teriam uma pergunta: o que instigou Rowling a inventar sua criatura discutivelmente mais detestável até agora? Parece que a criadora de Harry Potter está tendo uma revanche.

Para os iniciantes, Rita Skeeter aparece no quarto livro de Rowling que também é o de maior sucesso até agora, Harry Potter e o Cálice de Fogo. E Skeeter foi escrita em tecnicolor, direto da sala de guarda-roupa do elenco central.

Ela é uma “correspondente especial” do estilo-tablóide “Profeta Diário”, o jornal mais vendido no mundo de J.K. Rowling. Ela é descrita como uma bruxa em vestes carmim; “os cabelos da repórter estavam arrumados em cachos caprichosos e cuidadosamente rígidos que contrastavam estranhamente com seu rosto de queixo volumoso. Ela usava óculos com aros de pedrinhas. Os dedos grossos que seguravam uma bolsa de couro de crocodilo terminavam em unhas de cinco centímetros de comprimento, pintadas em escarlate”.

Depois de conduzir Harry à privacidade de um armário de vassouras segurando-o pelo braço com “surpreendente firmeza”, Skeeter prepara um aparelho mágico: a pena-de-repetição-rápida.

“Ela levou a pena verde à boca, chupou-a por um instante com cara de quem estava gostando, depois colocou-a em pé sobre o pergaminho, onde a pena ficou equilibrada tremendo ligeiramente.” Em um rápido teste, a pena escreveu: “A atraente Rita Sketter, 43 anos, cuja pena infrene já esvaziou muitas reputações inflamadas…”

Então quem foi a inspiração? Não vem tudo necessariamente de uma mulher. Novembro passado, Paul Henderson, no The Mail on Sunday, entrevistou o ex-marido português de Rowling, Jorge Arantes, o pai de sua filha. A história trouxe mais uma vez à tona alegações de abusos físicos dele. Arantes, um ex-jornalista sem dinheiro, também contestou a versão de Rowling de que ela teria começado a escrever a série Potter em Edimburgo. Ele disse que ela começou a escrever o primeiro volume, “Harry Potter e a Pedra Filosofal“, na casa deles em Oporto e já sabia como a série de sete volumes acabaria. Ele também alegou ter ajudado a editar o manuscrito.

Logo depois da entrevista do The Mail on Sunday com Jorge, apareceu outra história, de autor desconhecido, que Rowling insiste ser “totalmente forjada”. Estes dois eventos, ela afirmou, a levaram à depressão e a deixaram incapaz de escrever, reforçando sua reação à imprensa.

Ela processou um artigo do Daily Record há algum tempo esse ano, que a descreveu como “irascível, irritável, paranóica”, meio como JD Salinger ou Howard Hughes. Ele declarava que um garotinho e sua mãe que foram ao apartamento de Rowling para um autógrafo e foram “altamente repreendidos” por perturbá-la. O artigo citou vizinhos e amigos que declararam que ela se tornou “cada vez mais reclusa, nervosa e irascível” e também sugeriu que Rowling não aproveita muito sua notoriedade.

O artigo foi publicado em março desse ano, depois de terminado Cálice de Fogo, então Annie Brown, a autora, pode relaxar. Ela não é a modelo para Rita Skeeter. Brown também insiste que seu artigo, ainda que desagradável, foi devidamente pesquisado. “Talvez ela estivesse brava por ser tão realista”, Brown disse.

Há algumas dicas nessa busca pelo aninimato. O segundo personagem mais desagradável nos livros, o tio Válter Dursley de Harry, um não-bruxo odioso e de pensamento pequeno que criou Harry depois que seus pais morreram, é revelado como um leitor do Daily Mail. Talvez, então, o dedo possa apontar para Angela Levin, a entrevistadora chefe do Mail, que fez duas entrevistas com Rowling em 1998 e 1999, que provocaram com o tema ‘rico da noite para o dia’.

Mas Rosamund de la Hey, a editora de Rowling na Bloomsbury, é rápida para negar isso. Ela diz que a personagem “definitivamente, definitivamente não é” baseada em ninguém em particular. “Ele nunca nomeou ninguém, nunca”.

Skeeter sempre foi destinada a aparecer no quarto livro no rascunho do enredo de Rowling para a série de sete volumes. De qualquer forma, “ela admite tê-la escrito porque era divertido”. Então, Rowling está tomando revanche? “Ela nunca teria feito isso como uma razão exclusiva. Eu acho que ela se diverte ao escrever a personagem”.

Há, porém, um “certo frisson” concedido por suas experiências, a Sra. De la Hey admite. “Inegavelmente, ela tomou um prazer adicional ao escrever a personagem depois de suas experiências nos últimos três anos… Ela na verdade gosta muito dela”.

N/T: *hackette é a forma feminina de hack, que em meio jornalístico é a denominação para jornalistas que são pagos para escrever textos de baixa qualidade ou artigos maus elaborados, geralmente escritos com muita rapidez.

Traduzido por: Ana Carolina Feitosa em 07/01/2009.
Revisado por: Renata Grando em 09/01/2009.
Postado por: Vítor Werle em 11/01/2009.
Entrevista original no Accio Quote aqui.