Amini, Adeel. “Conversando com J.K. Rowling”. Student Magazine, 4 de março de 2008.

Com o cheiro perpétuo de lúpulos saltitando no ar e uma rajada forte o suficiente para levar você Skegness (nome da rua) abaixo, é normalmente difícil encontrar uma razão forte o suficiente para perambular por Edimburgo poucos anos depois. Mas ao mesmo tempo, é igualmente difícil não amar uma cidade onde você pode esbarrar em J.K. Rowling num café do centro, educadamente pedir uma entrevista, e quatro meses agonizantes depois ter uma audiência privada com indubitavelmente a autora mais famosa do mundo.

“Por favor, não chame assim”, insiste ela, com uma modéstia que parece ligeiramente suspeito no começo. Eu poderia argüir com ela considerando os múltiplos prêmios, fortuna infinita, e vendas norteando cerca de 400 milhões no mundo inteiro, mas eu acho que é melhor não enraivecer uma personalidade que já alegou ter um desgosto inerente por entrevistas. Em vez, disso eu a apresento a uma amiga que, além de tudo, evita o perigo mencionado anteriormente e se encaixa adequadamente com o seu conhecimento pontual no lugar da minha ignorância completa sobre todos os livros Potter (creio que o termo é trouxa).

Mas isso não é sobre Harry, não inteiramente. Isto é sobre uma mulher que foi lançada ao topo da literatura mundial na última década, certamente em termos de vendas e brilho. Agora que a sua franquia multimilionária parece estar concluída por enquanto, o que ela está preparando exatamente?

“Bem, eu tenho escrito um pouco, embora o final do ano passado fosse meio insano. Teve a turnê americana que fiz em outubro e eu também tirei tempo para descansar. Todo mundo continua me dizendo, ‘Oh, deve estar muito calmo agora’ mas de fato tem sido uma época com muita pressão – parece que todos que não me pediram coisas por dez anos fazem agora, e agora todos vêm com pressa. Há milhares de cartas por semana, há muitos assuntos para tratar no momento”.

O livro final de Harry Potter, Harry Potter e as Relíquias da Morte, foi lançado em julho de 2007 e foi rotulado como o manuscrito mais valioso da história. Todo esse tempo sem o bruxinho – ela sente a falta dele? “Sim”, fala ela, após ligeira hesitação. “Mas está melhorando. Logo após terminar, obviamente nós passamos pelo processo editorial, então eu ainda trabalhava nele. Não foi um fim abrupto, e me atingiu de fato no meu aniversário que é no último dia de julho”, o qual os fãs de Potter vão saber que ela divide o dia com seu herói, “e me atingiu como uma bola demolidora naquele momento”.

“Eu estava me preparando para isso por tanto tempo. Nos três últimos meses de escrita do sétimo livro, eu tive uma sensação constante e persistente que era isso. Era o fim. Era um final que eu tinha planejado por tanto tempo, e que visava escrever por tanto tempo. Então foi realmente dividido ao meio: metade alegria, e metade um senso de desolação. E então nós entramos no processo de edição e então você tem obviamente a publicação e aí dez dias depois o que me pegou foi: Eu não posso entrar mais naquele mundo. Acabou”.

É difícil ignorar o jeito divertido com o qual Rowling pronuncia cada frase, tornando compatível a uma autora de sua estatura. Sem dúvida provém dessa genuína, e claramente visível, paixão pelos livros, personagens, o mundo de que todos eles vêm; dessa transparência de emoção, você realmente percebe que com certeza isso não era uma aventura rentável escrita para encher seus cafés. Certamente, nesse caso, você não poderia dizer que ela nunca voltaria para uma parte tão importante de sua vida? “Bem, não, não poderia,” ela ri. “Ninguém nem pode imaginar. É um sentimento bastante isolado porque, é claro, existem muitos escritores que escreveram dentro de certo mundo, mas o meu foi 17 anos. E foram 17 anos que contiveram muita turbulência na minha vida; Harry era minha constante. Essa era a coisa que estava sempre lá, era como um relacionamento fantástico que era o meu centro… Estava acabado. E era enorme,” ela lamenta, como se ainda estivesse de luto.

Nós mudamos levemente o assunto e falamos sobre o recente documentário da ITV que foi ao ar por volta do natal de 2007. O filme, supostamente o relato mais definitivo da vida de Rowling até o momento, percorreu um ano de sua vida com melancolia surpreendente, incluindo algumas revelações muito pessoais. Uma admissão desse tipo foi o desconforto compreensível que Rowling sentiu quando fãs e paparazzi começaram a seguir cada movimento seu. Nesta etapa da sua vida, então, quase um ano desde a publicação do último livro, do que ela sente mais falta – Harry Potter ou seu anonimato?
Há uma pausa antes de responder. “Essa é uma excelente pergunta. Ninguém nunca me perguntou isso”. Ela pára para pensar mais uma vez enquanto eu aprecio um curto momento de satisfação pessoal. Pega essa, ITV.

Eu encorajo-a um pouco mais, dizendo que deve ser bem difícil ter estudantes de jornalismo desconhecidos aparecendo para ela no Starbucks e pedindo uma entrevista… “Sinceramente, varia com o tempo,” ela admite finalmente. “Definitivamente há momentos nos dez anos em que estive sendo publicada que eu teria dado quase qualquer coisa para ter o anonimato de volta, mas aqueles eram tempos ruins e na verdade eles nunca tiveram qualquer coisa a ver com pessoas aparecendo para mim no Starbucks. Porque pessoas aparecendo para mim no Starbucks são sempre encantadoras. Sempre.”.
Não consigo evitar zombar, em parte descrente, mas também para inutilmente fugir do assunto a respeito de qualquer aprovação estúpida de um conglomerado de café. “É verdade, é verdade!”. Rowling protesta. “Sabe, até onde consigo me lembrar… Eu não precisaria de todos os dedos de uma mão para pensar em qualquer um que alguma vez tenha se aproximado de mim e tenha sido de uma forma grosseira – eu estou deixando de lado os eBayers, os que eu chamo de eBayers, eles são muito agressivos, mas não é sobre ser um fã, é sobre fazer o máximo de dinheiro possível, daí eles podem ser bastante assustadores – mas houve tempos em que eu teria dado qualquer coisa para ter o anonimato de volta. Eu me sentia em estado de sítio em certos momentos. Nunca esperei jornalistas virem bater na minha porta da frente. Teve um período no meio de tudo que foi muito estressante”.

Rowling está se referindo aos muitos momentos de mídia cercando e, de forma mais alarmante, pessoas fuçando suas latas de lixo. “Gente tem procurado nas latas de lixo, elas tem oferecido dinheiro a amigos e ex-namorados e membros da família, elas ligam para a sua família, eles tentam engatar uma conversa antes de dizer ‘Eu sou do Daily Mail’. Agora estou bem forte em relação a isso, agora eu aprendi a lidar. Eu entendo qual é o objetivo, e tenho sido bem dura com isso há algum tempo, mas antes não era. Eu lutava para ficar à parte do que acontecia comigo, e todas essas coisas me pareciam muito pessoais e invasivas. Eu tenho uma simpatia enorme com as pessoas que lidam com isso”.

Com o risco de soar insistente e insensível, insisto em uma resposta para minha pergunta anterior. “Nesse momento sinto mais falta de Harry,” ela declara. “Eu sinto. Sinto falta dele como um personagem, mas o fato interessante é que ele nunca foi o personagem mais popular nos livros. Na verdade houve uma enquete há um tempo atrás e algo como 2% dos leitores disse que Harry era seu personagem favorito. Existem muito mais personagens óbvios para amar: Hagrid, Rony, todo mundo ama Rony, quer dizer, quem não gosta de Rony…”.

Harry é o seu favorito? “Ehhh, ele está nessa posição, porque é o meu herói, então claramente eu o escolheria. Mas ele nem sempre é agradável, mas acho que isso está correto. Ele é uma pessoa com raiva – mas ele tinha que ser!” ela ri, de um jeito indefinível metade mulher, metade riso de estudante, que aparece ao longo de nossa conversa. “Seria sem senso pensar que um pobre rapaz de 15 anos que está salvando o mundo repetidamente, sem gratidão na maior parte do tempo”, – a risada se torna mais ranzinza nesse ponto – “não estaria em algum momento pensando, ‘Por que eu tenho que fazer isso? Por que tem que ser eu?’ Então sim, ele tem muitas raivas e ele certamente desconta nos seus amigos, mas um fato sobre Harry é que ele não tem em quem descontar”. Ahh.

Rowling afirmou muitas vezes que nem sempre ela foi feliz com seu trabalho, sem dúvida um pensamento normal para qualquer personalidade criativa. Tem alguma coisa que ela voltaria atrás e mudaria? “Tem dois livros que eu voltaria e faria um bom corte de diretor: Cálice de Fogo e Ordem da Fênix. Ordem da Fênix com certeza é longo demais, mas assim como Câmara Secreta, ambos são capítulos de transição na história como um todo, então as informações tem que ser dadas em ambos, e Harry tem que visitar lugares em ambos. Agora que o sétimo está lançado você pode ver que ele tinha que ir para o Ministério da Magia, ele tinha que saber que existia um basilisco embaixo da escola, tinham certas coisas que ele tinha que conhecer e informações que ele tinha que adquirir e numa série como essa você tem que ter capítulos intermediários. Fênix poderia ter sido encurtado. Eu estava num estado de exaustão avançada quando estava escrevendo ele, estava em gravidez avançada no final dele e simplesmente gastei toda a minha energia. Certamente precisa de um trabalho de revisão”.

Ela continua: “Estatisticamente tem coisas que eu poderia mudar. Obviamente quando você está escrevendo por um período de 10 anos você muda, mas eu acho que esses dois livros talvez mostrem o fato de que eu estava no maior período de estresse quando estava escrevendo esses dois livros… e acho que isso aparece. Resumindo, em termos de linhas narrativas e personagens principais e etc, foi bem planejado e eu não poderia mudar eles”.

Ela tinha lido algum dos seus próprios livros novamente? “O único que eu voltei atrás e reli desde a publicação foi o sétimo livro, que é o meu favorito.” Rowling aparentemente tinha planejado o final logo, pouco tempo depois do começo da série inteira. “Sim, esse é o ponto em que eu estava trabalhando por 17 anos então com certeza seria uma grande experiência catártica e eu tinha pensado muito nisso. Mas também foi imensamente libertador não estar mais escrevendo uma história de escola, só tirá-los de Hogwarts, embora eu ame Hogwarts. Você provavelmente poderia extrair algumas outras boas histórias de Hogwarts, há tanta coisa lá, mas as restrições que a carga horária de uma escola põe em cima de seus personagens são enormes. E nunca ter que escrever outro jogo de quadribol,” ela ri. “A coisa que me manterá longe de Hogwarts pela próxima geração é ter que fazer um quadribol ruim novamente, a não ser que eu decida que meu herói dessa vez não vai jogar quadribol. Então ele pode ter aventuras enquanto outra pessoa joga quadribol!”.

Eu ressalto o quão interessante eu acho que Rowling, em todas as suas entrevistas recentes, ainda se refere a todos esses enredos em potencial com uma quase certeza na sua voz. Certamente parece ter ainda algo ali, alguma coisa que ela tem relutância aparente em deixar acontecer. “Sempre digo que não diria nunca, mas por outro lado eu falo fim antes que alguém fique animado e isso seja publicado no “Daily Record: ‘Rowling promete Livro Oito!’” ela dá gargalhadas. “Não está nos meus planos. De forma divertida, durante a filmagem do documentário eu disse que Harry e Gina teriam três filhos e que o do meio é o que me interessa mais…”.

Deus do céu, Alvo Severo, certo? “Deus, que peso dar a uma criança esses dois nomes. Absolutamente cruel você não acha? ”, ela ri. “Não somente porque são nomes horríveis, mas também pela história que há atrás deles! Mas não, não estou planejando isso. Eu falo repetidamente que quem sabe em dez anos, essa é a escala de tempo que eu poderia estar considerando, no mínimo, porque tem outras coisas que quero fazer, e porque para minha própria saúde mental eu preciso respirar fora disso”.

Mesmo assim, deve ser legal saber que os livros de Harry Potter são adorados por crianças e adultos igualmente, que têm se tornado um clássico de certo modo, e que serão transmitidos por gerações? “É um sentimento fantástico. Na verdade o que você disse por último é o sentimento mais incrível.” Minha amiga admite que realmente vai ler os livros para seus filhos, levando a uma visível onda de alegria desordenada tomar conta da autora. “Este é o fato mais importante para mim. Eu disse isso para o meu marido alguns dias atrás porque recebi uma carta que dizia algo assim e eu disse para ele como é maravilhoso ouvir isso. Outro fato incrível de escutar, eu tenho algumas cartas falando isso, que a família inteira poderia estar junta, ler um capítulo juntos, e então eles se separam e concordam em ler os dois seguintes separados e posteriormente eles se encontram novamente e lêem o próximo capítulo juntos”.

Rowling se esforça por palavras, genuinamente dominada pela emoção. Minhas dúvidas anteriores foram completamente aliviadas; falsa modéstia isso certamente não é. “Esse é um maravilhoso, sentimento maravilhoso, pensar que você fisicamente – para não dar muito uma de Poliana – mas você fisicamente uniu pessoas de diferentes idades, gerações até, e é algo que todo mundo tem compartilhado… não há nada, nada melhor do que isso”. Doce como deve ser, não consigo nem por um segundo duvidar de que Rowling fala sério cada palavra que diz, tal é sua franqueza claramente comovente.

Nós falamos mais um pouco sobre o último livro, deliberando sobre a contagem chocante de mortes. “Isto é a guerra”, explica sinceramente Rowling. “Mas eu só chorei uma vez durante o processo de correções e isso foi quando editei o sétimo. Estávamos falando sobre o Epílogo e a primeira versão do Epílogo teria informação demais. Eu tinha o impulso de dizer tudo para que se soubesse quem eram as crianças de cada um. Assim que criei muito mais impressionista e você simplesmente escuta vozes entre a neblina; gosto mais da versão final. Mas na primeira versão você via o Teddy Lupin, e quando falamos em cortá-lo eu disse: “Tenho que mencionar o Teddy” e comecei a chorar. “Eu preciso saber que ele está bem. Eu precisava saber que ele estava bem!”, exclama ela. “Esqueça o leitor, eu apenas precisava colocar preto no branco que ele estava bem, que era feliz, que tinha uma namorada e que Harry estava envolvido na vida dele. Tinha que mostrar como Harry carregou a tarefa e que era fisicamente pai não apenas de seus filhos, mas também de Teddy. Ele não fugiu de suas obrigações, ele se tornou o padrinho que ele gostaria de ter tido, mas não podia ter”.

Chega de enredo Potter, eu acho. Passando para uma questão mais polêmica, Rowling tem dito categoricamente que acredita em uma força maior, declaração reforçada por suas idas à igreja na infância (“Até eu ter 17 anos,” esclarece). Deve ser difícil conciliar suas crenças religiosas com aqueles que condenam Harry Potter como anticristão, me questiono em voz alta. A expressão de Rowling não muda uma fração. “Teve um comentarista cristão que disse que Harry Potter tinha sido a maior oportunidade perdida pela igreja cristã. E eu pensei, existe alguém que de fato tem seus olhos abertos”.
“Eu acho que ele disse antes do lançamento do sétimo livro, e com o lançamento do sétimo livro. Eu acho que isso clareou a visão de muitas pessoas em que lado eu estava. Mas eu preciso enfatizar que não estou forçando especificamente uma agenda Cristã, e de fato, até perto do final do sétimo livro, alguém pode interpretar o que acontece com Harry após ele encontrar a própria morte como ele estando num estado inconsciente no qual seu subconsciente revela a ele o que ele já sabia”. Eu me inclino numa compreensão falsa ao que ela se refere; por sorte meu companheiro entendido acena freneticamente. Procede.

“Qualquer re-leitura do capítulo 35 vai mostrar para você que não há nada além do Dumbledore… ele parece dizer que ele não poderia adivinhar sozinho ou já ter percebido, e é claro que há uma informação chave que Dumbledore não fala, mas que Harry percebe. Então você pode interpretar deliberadamente daquela forma, ou você pode dizer que ele esteve num estado de limbo, além do qual havia outra vida, e esta idéia foi expressa repetidamente, e mais explicitamente no final do livro cinco, Ordem da Fênix, onde Harry entende que há uma ‘entrada’, que você passa. Queria que houvesse um conflito aqui, de forma que meus três personagens principais – quando chegam à sala onde se estuda a morte no Ministério da Magia – Hermione, a pessoa super-racional e cética até o fim, não ouve nada atrás do véu e se assusta; Rony fica tenso: Rony é alguém que não enfrentaria algo mais profundo que uma cerveja, se puder evitá-la; Harry o aceitou, e aqui é ligeiramente imprudente, porque Harry não faz nem idéia de como pode ser perigosa a atração de morte para um adolescente”. Pesado.

Um grau de má interpretação inevitavelmente resulta da ambigüidade. Uma certa parte tem aversão intensa a Harry Potter. “Oh, veementemente,” diz Rowling, antes de sussurrar… “e eles mandam ameaças de morte”.

Minhas orelhas se levantam. Ameaças de morte? Para esse indivíduo aparentemente inofensivo, de fala mansa na minha frente? “Uma vez, sim. Bom, mais de uma vez.” Novamente aquela risada indecifrável. “É cômico em retrospectiva. Eu estava na América, e havia uma ameaça feita contra uma livraria – na qual eu ia aparecer, então tivemos a polícia lá”. E ainda assim ela compareceu? “Oh, sim. Obviamente as coisas foram checadas e eu nunca deixaria crianças irem lá nem por um segundo se eu pensasse que havia alguma substância nisso. Eu acho que era apenas alguém que queria impedir a atividade”.

Ameaças de morte à parte, qual foi o pior, ou melhor comentário que ela já recebeu? Ela pausa pelo que parece ser uma era. “Bom, melhor… tantos. Eu não quero falar porque vai parecer que estou inventando”. Se essa modéstia parece ligeiramente inacreditável no início, é o contrário agora. Em todo caso eu a pressiono por pelo menos um ou dois exemplos.

“Bem… Eu suponho que qualquer comentário de um fã me dizendo o que o livro significou para ele em um modo pessoal são sempre maravilhosos de ouvir porque as pessoas no fim da adolescência, começo dos 20, literalmente cresceram com Harry. Ele envelheceu, eles envelheceram, e ele foi um grande fator na infância deles o que é uma coisa incrível, incrível para mim de saber, encontrar pessoas que aos 11 anos leram o primeiro livro e assim por diante. É claro que eles ultrapassaram-no porque ele envelhecia mais lentamente lá pelo meio do caminho!”.

E piores comentários? Uma longa pausa novamente; Rowling é quase carinhosamente desconfortável em sua relutância sobre falar de como seu trabalho tem sido criticado. “Eu posso lidar com uma revisão ruim. Ninguém ama uma revisão ruim, mas uma revisão útil é aquela que te ensina algo. Então eu não tenho problemas com isso para ser franca, mas ninguém dá uma festa se recebe uma crítica ruim e eu tive uma mistura de muito boa passando para terrível. Então você adquire bastante prática nisso. Para ser honesta, a coisa Cristã fundamentalista foi ruim. Eu teria ficado muito feliz em sentar lá e debater com os críticos que estavam vendo Harry Potter com uma perspectiva moral. Meu editor americano falou, e eu penso de forma bastante correta, você não poderia persuadí-los nem em milhões de anos. É um exercício na futilidade… e eu tenho certeza que ele estava certo”.

Rowling revela uma boa vontade em entrar nesse tipo de debate. “Em um sentido, nós trocamos argumentos pela mídia, eu acho. Eu tentei ser racional sobre isso. Há uma mulher na Carolina do Norte ou Alabama que vem tentando banir os livros – ela é mãe de quatro crianças e nunca os leu. Ela está tentando banir eles há dois ou três anos eu acho. E, inevitavelmente, jornalistas continuam falando para ela, ‘porque você não os leu?’, e ela diz ‘bem, eles são longos e eu sou ocupada’, e então – eu não estou mentindo e não estou nem tirando sarro, essa é a verdade do que ela falou”, ecoa novamente outra gargalhada híbrida, “e bem recentemente perguntaram-na e ela disse ‘Bom, eu rezei sobre se deveria ou não lê-los e Deus me disse não’”.

Rowling pausa para refletir o peso de sua fala, sua expressão de uma absoluta incredibilidade. “Veja, aí é onde eu absolutamente me separo da companhia das pessoas daquele lado da cerca, porque isso é fundamentalismo. Fundamentalismo é ‘Não vou abrir minha mente para olhar o seu lado do argumento de maneira nenhuma. Eu não vou ler, não vou olhar, estou muito assustado’. E isso, para mim, é fundamentalismo, e é isso que é perigoso, seja politicamente extremo ou religiosamente extremo… Na verdade fundamentalistas de todas as maiores religiões, se você os colocasse em uma sala, eles teriam malas em comum!” ela ri alto, antes de se acalmar. “Eles odeiam as mesmas coisas, é algo tão irônico”.

Eu concordo, relatando como fundamentalismo religioso pode tornar a vida difícil para a maioria moderada, que a única coisa que os fundamentalistas tem em comum é sua desaprovação inerente. “Bem, sim. É histórico. Eu acho que teve um tipo de parada dos direitos gays em Israel, acho que foi no ano passado, e é claro que ortodoxos judeus extremistas pegaram em armas por causa dela”. Rowling tenta sufocar sem sucesso sua risada enquanto continua. “Enquanto isso na Palestina você tinha as pessoas fundamentalmente mais religiosas dizendo ‘apesar de nós detestarmos Israel e ele não deveria existir, nós concordamos de todo coração que homossexuais estão além da linha’”. A risada atinge um máximo. “Sim, pelo menos você está falando! Infelizmente você tem que exterminar outra parte da sociedade para poder falar mas…”.

Admissivelmente, de alguma forma é de aquecer o coração ver Rowling em primeiro lugar se engajar tão ativamente em tópicos como esse e em segundo ser capaz de rir abertamente nesse momento de sua vida. É de conhecimento público que Rowling começou com nada mais do que um barato flat em Leith e uma filha bebê para cuidar. Isso foi 17 anos atrás – como ela sente que cresceu como pessoa desde então? “Eu tinha 25 quando tive a idéia, e obviamente tenho 42 agora, então você esperaria algumas mudanças!” ri ela. “Eu sou muito mais feliz agora, mas não pelas razões que as pessoas esperariam”. Rowling está claramente se referindo a sua recente posição na lista Forbes como a segunda mulher mais rica no entretenimento, perdendo apenas para Oprah Winfrey. Sua humildade a impede até mesmo de querer elaborar. “Eu sou mais feliz porque estou fazendo o que eu queria fazer, o que não estava aos 25. Aos 25, eu estava escrevendo constantemente, mas escondida, não era uma fonte de renda”.

“Eu vivia uma existência muito estranha mesmo aos 25, e eu acho que sucesso, o bom tipo de sucesso, traz consigo certa confidência e eu sou uma pessoa muito mais confiante… o que não diz muito, porque eu era uma pessoa eternamente insegura aos 25, então agora eu acho que provavelmente cheguei a um nível saudável. Eu ainda fico extremamente nervosa quando tenho que falar em público, e seria bem errado pensar que cada vez que eu escrevo uma página eu penso ‘bestseller instantâneo’; eu sou muito autocrítica”.

Sobre o assunto de falar em público, como ela consegue ficar calma quando fala para 17.000 pessoas, como fez no lançamento do último livro? “Bem, o começo foi em Toronto, o Skydome. Eu concordei com aquilo, que foi apenas ridículo. Eu estava no meio da escrita e eles falaram apenas ‘Festival de livro, Toronto, muitas pessoas’ e me lembro da conversa. Eu disse, ‘Sim, ok, certo, eu vou fazer’, literalmente: ‘Você poderia, por favor, desligar o telefone, por favor, eu tenho uma hora antes de Jéssica [a filha de Rowling do seu primeiro casamento com um jornalista português] sair da escola, eu tenho que terminar este capítulo’. E então eu me confortei com o que eu sempre me conforto quando essas coisas chegam – eu pensei ‘eu posso morrer antes de acontecer’”, ela ri defensiva, quase nervosamente, “o que eu sei que soa mórbido, não é intencionado para soar mórbido, mas eu realmente pensei… Nós todos poderíamos estar mortos, eu não vou me estressar antes de chegar. Mas foi um momento com bastante progresso para mim. Antes disso, de falar em público, eu sempre costumava pensar: não pode ser pior do que um parto”. Ela ri alto. “Isso não foi muito confortante para ser totalmente honesta com você, mas agora eu penso ‘Se você fez o Skydome, você pode fazer isso’. Isso reduziu muito meu nível de ansiedade”.

Se há uma constante tanto nos trabalhos como nas entrevistas de Rowling, é esse conceito de morbidez, que, eu não posso evitar de notar, ela brevemente esconde, defende, e então passa adiante. Não é nenhum segredo que Rowling sofreu depressão quando vivia em Leith antes dos livros serem publicados, uma forte metáfora que é encontrada na série Harry Poter através dos dementadores. Nós discutimos a ampla documentação do fato de que a depressão está em crescimento entre jovens e particularmente estudantes universitários nos dias de hoje.

“Eu definitivamente tive inclinações à depressão em uma idade bastante nova,” Rowling reconhece, “mas é uma situação extremamente difícil de reconhecer em você mesmo, porque obviamente há uma área cinzenta antes de se tornar uma doença clínica e, olhando para trás, consigo ver que tive características de depressão com alguns intervalos durante um tempo. Então, nos 20 anos e meio, as circunstâncias de vida estavam ruins e eu realmente despenquei. O que é triste de uma forma é que a coisa que mais me fez ir até a ajuda, a coisa que me fez encarar o fato que não era um estado normal em que eu estava, foi provavelmente minha filha, e muitas pessoas de sua idade, muitos adultos jovens, não teriam isso. Sei que olhava para ela e pensava… Ela era como uma pedra de certa forma, ela era algo que me deixava na Terra, me prendia ao chão, e eu pensei ‘isso não está certo, isso não pode estar certo, ela não pode crescer comigo nesse estado’.

“E eu fui ao – bem, história engraçada na verdade, “ilustra tantos problemas”. Rowling diz, a amálgama risada nervosa voltando à cena. “Eu fui a minha clínica geral. Ensaiei sozinha nesse apartamento pequeno e horrível, ensaiei o que eu ia dizer a minha clínica geral porque não é uma coisa fácil de dizer a alguém; eu entrei para ver essa clínica geral e não era a minha usual, e dei o meu pequeno discurso. Eu tinha escolhido dizer certas coisas sobre o meu estado mental para ilustrar o que eu estava achando preocupante e ela disse: ‘se um dia você se sentir um pouco deprimida, venha falar com a enfermeira’ e me dispensou”.

“Eu voltei, e nós estamos falando sobre pensamentos suicidas aqui, não um ‘Eu me sinto um pouco infeliz”, Rowling ri nervosa, como se para disfarçar a gravidade do seu estado psicológico na época. “Mas duas semanas depois recebi um telefonema no meu apartamento da minha habitual clínica geral, que tinha lembrado das anotações do que tinha acontecido enquanto estivera fora, e tinha ficado alarmada em ver que eu havia sido mandada embora. Ela me chamou de volta, e eu recebi acompanhamento através dela. E aí eu conto a história, mas não estou menosprezando a profissão médica – especialmente agora que estou casada com um clínico geral,” ela diz com mais que uma ponta de malícia. “Mas ela me salvou absolutamente, porque não acho que teria tido coragem de ir e fazer duas vezes. Tendo sido dispensada uma vez, eu tinha dado a minha melhor tentativa e voltei e me senti pior do que nunca, mas ela me chamou de volta e fui para o acompanhamento, o Cognitive Behavioural Counselling”.

É algo que ela recomendaria para outros, então? “Eu recomendaria altamente. Recomendaria. É, eu acho que foi absolutamente inestimável. Bem, funcionou para mim então obviamente sou ‘pró’. Você tem que se esforçar muito, sabe. Realisticamente, você tem que se esforçar muito, você tem que estar preparado para fazer o que lhe mandam e perseverar. Eu acho que estive em consultas por nove meses. Eu provavelmente poderia ter feito por mais tempo. Acho que estava com muito pé atrás com a idéia de me tornar dependente de alguma coisa, que era em parte uma característica da minha condição. Eu estava numa posição tão isolada e estranhamente você fica com medo de depender de algo, porque aí [você pensa] ‘Vou perder aquilo’. Eu provavelmente saí um pouco cedo, mas…”. Ela pausa. Tudo trabalhou para melhor, eu me arrisco. “Absolutamente. E te dá estratégias para depois. Eu estou preocupada agora que você disse isso sobre minha depressão e eu quero dizer a todo mundo que eles devem ir e buscar ajuda…!”.

Eu digo que talvez a afirmação de Rowling possa ajudar a remover o estigma ligado às idéias de depressão e consultas. “A coisa engraçada é que eu nunca estive remotamente envergonhada de ter tido depressão. Nunca. Eu acho que sou anormalmente desavergonhada sobre isso, porque, o que há para sentir vergonha? O que tem aí para se ter vergonha?”. “Eu passei por uma época realmente difícil, e tenho muito orgulho do fato de que saí dela. É muito trabalho, não é uma coisa passiva, acompanhamento, você tem que trabalhar com aquela pessoa e…”. Ela faz uma pausa, mudando abruptamente de tópico. “Eu acho que é uma época muito difícil para ser jovem no momento. Eu me preocupo com isso, tenho uma filha adolescente e acho que nossa cultura no momento está… aterrorizada pelos jovens. Você não acha? Isso realmente me preocupa. Parece ter essa aceitação cultural de jovens como ameaçadores”.

Ameaçadores? Confesso que não entendo seu argumento. “Bem,” ela tropeça. “Eu acho que os jovens, adolescentes, são muito banalizados na Grã-Bretanha. Você não acha?”. Banalizado pode ser uma palavra forte demais, receio. “Mas acho que é. O jeito que se fala dos jovens como se houvesse uma diversidade sobre eles, são extraterrestres. Eu penso que parece ter um verdadeiro… medo dos jovens. Não em todo lugar, mas de certa forma, fala-se deles e os noticiam”.

Eu não posso evitar pensar o que se esconde por trás da palavra ‘noticiam’. Rowling teve inúmeros problemas com a imprensa no passado, e eu pergunto se ela acredita que há uma ligação entre o que ela está se referindo e à cultura Heat Magazine que os jovens estão comprando. Eu trago o tópico da recente advertência que ela recebeu da imprensa por ter comentado a imagem do corpo de meninas jovens. De uma vez, Rowling fica mais séria do que esteve até então. “Isso é algo que tem particularmente pesado em mim. Há algumas pessoas para as quais eu tenho escrito e algumas anoréxicas nessa categoria”. Mais uma vez, uma longa pausa que expressa mais desconforto nessa mulher diferente e articulada que quaisquer palavras poderiam expressar. No entanto, as pessoas criticaram suas afirmações.

“Bom, deixe eles”, ela diz audaciosamente. “Eles sempre criticam quando você diz alguma coisa desse tipo mas, para mim – eu tenho que ser muito cuidadosa com o que eu digo aqui”, Rowling pausa, delicadamente medindo suas palavras para evitar futuros problemas. “É um fato que em websites que são pró-anorexia – e eles realmente existem – eles usam imagens, certas imagens de certas mulheres famosas que eles chamam de ‘thinspiration’ (inspiração magra). É uma doença. Eu argumentaria que a imagem corporal promovida por certas seções da indústria da moda são pró-anorexia. Eu absolutamente me recuso a acreditar que certas mulheres estão comendo e se exercitando normalmente e mantendo aquele corpo. Eu me recuso a acreditar nisso. Claro que existem mulheres naturalmente magras,” ela afirma, “mas isso está além de magreza. Você não pode manter essa forma corporal e essa beleza em um dieta normal. Então o que é isso? Eu acho que é pró-anorexia”.

Não uma fã de America’s Next Top Model, eu deduzo. “É tudo sobre dinheiro, a indústria da moda”, ela suspira, antes de se corrigir. “Não a indústria da moda, desculpe, a indústria da beleza. Se você mantiver as mulheres inseguras elas vão continuar gastando dinheiro e fundamentalmente é sobre isso”.

De uma controvérsia para a outra, parece inevitável que o tópico da sexualidade de Dumbledore fosse surgir nessa entrevista. Como Rowling lidou com os efeitos? “Foi engraçado, na maior parte!”, ela exclama. “Eu tinha sempre visto Dumbledore como gay, mas em um sentido isso não é grande coisa. O livro não era sobre Dumbledore sendo gay. É só que por fora eu obviamente sabia que ele tinha esse grande, escondido segredo e que ele flertava com a idéia de exatamente o que Voldemort faz, ele flertava com a idéia de dominação racial, que ele iria subjugar trouxas. Então esse era o grande segredo de Dumbledore”.

“Então por que ele flertava com isso?”, ela pergunta. “Ele é um homem bom por natureza, o que o faria fazer isso? Eu nem pensei nisso dessa forma, simplesmente pareceu vir até mim, eu pensei ‘eu sei porque ele fez isso, ele se apaixonou’. E se eles consumaram essa paixão fisicamente ou não, não é a questão. A questão é amor. Não é sobre sexo. Então isso é o que eu sabia sobre Dumbledore. E é relevante somente que ele se apaixonou e foi totalmente, esse grande campeão do amor que ele foi durante sua vida, foi feito totalmente de tolo pelo amor, e ele perdeu completamente sua bússola moral quando se apaixonou e eu acho que subseqüentemente se tornou muito desconfiado do seu próprio julgamento nesses assuntos, então se tornou bem assexuado. Ele levou uma vida celibatária e de leitura”.

Claramente, algumas pessoas não enxergaram as coisas deste modo. “É uma questão muito interessante, porque eu acho que a homofobia é o medo que as pessoas têm de amar, mais ainda do que do próprio ato sexual. Parece que existe um desgosto inato pelo amor envolvido, o que eu acho absolutamente extraordinário. Foi impressionante no Carnegie Hall porque depois de tudo eu fui para o meu quarto no hotel e liguei o Fox News e repórter estava dizendo ‘DUMBLEDORE É GAY’”. Mais uma vez Rowling solta uma grande gargalhada, seguindo adiante com os tópicos sérios nós tínhamos acabado de discutir com uma extraordinária rapidez. “Mais tarde nesse dia eu fui até Nova Iorque e fui no Barney’s, acho que para comprar um top e eu peguei um e esse vendedor veio até mim que eu tenho certeza era 99% gay e ele disse, ‘Ótima cor, cor fabulosa não é? Você vai levar esse?’ Eu disse ‘Vou’ e ele disse ‘Você é JK Rowling?’ e eu disse ‘Sim’ e ele disse (usando uma voz americana realmente alta e afeminada) ‘Dumbledore é GAY?’” A risada vêm novamente.

Como ela reage diante daqueles que discordam de um personagem homossexual num livro infanto-juvenil? “E daí?”, ela retalha imediatamente. “Eu acho que aconteceu de um dos dois modos. Houve pessoas que pensaram ‘bem, por que então não vimos a angústia de Dumbledore sobre ser gay?’”. Rowling fica claramente surpresa com isso, e com razão. “Quando isso iria aparecer? ‘Harry, sente-se, deixe-me fazer uma xícara chá para você, vamos discutir algo… Já chega dessas Relíquias…’ Absolutamente ridículo. E outra coisa era — e eu recebi cartas dizendo isso — que, como um homossexual, ele não teria segurança suficiente para lecionar em uma escola”.

Um ar de incredulidade invade a sala, como se a própria Rowling não conseguisse acreditar em si mesma. Segundos de silêncio antes que ela continue: “Ele é um homem solteiro e muito velho. Você deve se perguntar: por que isso é tão interessante? As pessoas devem observar suas próprias atitudes. É uma sombra no personagem. Será que esta é a coisa mais importante nele? Não. Estamos falando de Dumbledore, pelo amor de Deus. Existem 20 coisas que são relevantes para a história antes de sua sexualidade”. Conclusão, então: ele não é um personagem homossexual, apenas um personagem que por acaso é homossexual. Rowling concorda veementemente.

Mais alguma coisa que ela sempre assumiu e gostaria de declarar agora? “É difícil pensar em alguma coisa específica agora. Há coisas que eu sempre pensei serem óbvias em alguns personagens, muito óbvias. Eu sempre pensei que era meio óbvio que Rony e Hermione… muita da tensão era devido a eles gostarem um do outro em vez de não se gostarem, mas você ficaria surpreso. Algumas pessoas estavam simplesmente iradas com isso”.

A conversa muda para a cidade que fez essa entrevista possível. Rowling disse que Edimburgo, e particularmente o flat em Leith, tem muitos fantasmas para ela – um fato exibido pela sua recaída televisiva quando ela retornou lá para o documentário. Então porque voltar para Edimburgo, porque criar uma base aqui depois de tanto anos? “É uma casa”, vem imediatamente a resposta. “Eu absolutamente amo Edimburgo, esse é o período mais longo que eu já vive em qualquer lugar, incluindo quando eu era uma criança”.

Ela pausa, talvez se perguntando o que estimulou a pergunta. “Sabe, talvez o documentário tenha dado uma falsa impressão porque embora tenha sido intensamente tocante e eu nunca vá esquecer ter voltado àquele flat e Leith, meu coração se levanta quando vou até Leith. Foi um tempo difícil, mas foi lá que muita coisa aconteceu em minha vida, que foi o trampolim de tudo que veio depois e ainda é muito parte de mim, aquele lugar. E eu gosto de Leith”, ela acrescenta.

Ela acredita que há alguma influência de Edimburgo no livro? “Para ser sincera, não. Tem um cara em uma das escolas particulares, eu não vou dizer o nome de quem me escreveu e disse que eu claramente tinha baseado Hogwarts na escola dele. E eu respondi e disse, muito educadamente, que na verdade eu tinha imaginado Hogwarts antes mesmo de sequer ver a escola dele e isso foi há anos e anos atrás. Eu comecei a escrever sobre Hogwarts quando estava morando na Inglaterra. E ele me escreveu novamente dizendo, ‘não, você está enganada, sem dúvida você se baseou na minha escola’… nesse ponto a correspondência cessou”, ela ri.

A esta altura, uma hora já havia se passado – muito mais tempo do que haviam nos concedido de primeira. Eu começo a disparar algumas perguntas rápidas, apesar da propensão de Rowling de responder com sentenças longas, porém interessantes, que impediram que elas fossem tão ligeiras. A última coisa que ela leu, eu pergunto: “Ele morreu tragicamente, mas isso era Harry Thompson, “This Thing of Darkness”. Foi a última coisa contemporânea que eu li. Muito, muito bom.”

Eu não resisti em perguntar sobre os seus novos projetos, um já rotulado como um “conto de fadas policial” e o outro dirigido aos adultos. “Bem, o das crianças ainda não está terminado. Eu gosto muito dele, acho que provavelmente seja para crianças pequenas, e menor – felizmente – do que um romance de Potter, mas eu gosto muito. E o outro, eu nem sei se verá a luz do dia, mas é divertido escrever”. Eu tento conseguir mais informações, mas mesmo com chantagem emocional, Rowling permanece de boca fechada. “Desculpe, eu não posso, eu não posso!”, ela ri. “No minuto em que eu disser qualquer coisa, imediatamente minha vida se tornará mais complicada”. Compreensível, dado ao intervalo dos catadores de lixo desse planeta. E a famosa Potter enciclopédia, a nova ruína de sua existência e raiz de recentes problemas jurídicos? “Bem, de certo modo estou trabalhando nisso… de fato, estou trabalhando nisso. Eu só não quero ter que trabalhar com uma data de entrega, mas eu estou juntado os dados devagar”.

Os minutos finais de nossa conversa divagam por vários tópicos, de alguma forma chegando a apresentação humorística, ponto no qual Rowling atinge uma excitação de proporções adolescentes, arfando e até rindo alto. “Eu sempre quis…”, ela começa, antes de fazer uma pausa e se dirigir ao aparelho de gravação diante dela, “Posso só dizer que não é o que eu estou escrevendo… mas eu sempre quis escrever sobre um comediante de uma apresentação humorística. Embora não seja o que eu estou escrevendo, então se alguma coisa sair na semana que vem não sou eu, não estou fazendo isso”, ela revela.

Meu tempo acaba, apesar da nítida relutância em partir de ambas as partes. Nesse ponto eu anuncio meu mundo trouxa, evocando ainda mais risos de Rowling, enquanto ela me acusa de “fingir” – uma acusação que, por mais tentadora que possa ser para jornalistas britânicos exagerados, eu simplesmente não posso colocar nela. Por todo o seu sucesso, por todo o seu reconhecimento internacional, Rowling continua tão vulnerável e tão modesta quanto qualquer outro, quase desnorteada e perplexa pelo estardalhaço a sua volta – sua alegria parece ter superado a escuridão em sua vida e de sua família mais do que ganhar milhões. É animador, para dizer o mínimo, que ela ainda perambula pela cidade da mesma maneira despretensiosa… de qualquer forma, dado ao modo como essa entrevista ocorreu, eu acho que você não poderá vê-la no Starbucks a qualquer hora dentro de pouco tempo.

Traduzido por: Virág Venekey, Renan da C. C. Silva, Renata Grando, Camila Lazarotto em 02/04/2008.
Postado por: Vítor Werle em 28/01/2009.