Johnstone, Anne. “Nós somos malucos por Harry”. The Herald, 26 de janeiro de 1999

O que faz uma varinha ser mágica? Dois anos atrás essa pergunta seria recebida com atordoamento. Hoje, bem, nós todos sabemos, não? Pêlo de unicórnio, pena da cauda de uma fênix e corda de coração de dragão.

Na primavera de 1997, quando a Bloomsbury me enviou um rascunho de Harry Potter e a Pedra Filosofal, a revelação que uma paupérrima mãe solteira escrevera este primeiro romance sobre centenas de cafés expressos mornos em um café de Edimburgo parecia estratégia de marketing… até eu lê-lo.

Você não precisa ser um crítico aclamado para saber que era puro ouro, que em 100 anos a frente, crianças de nove anos ainda estarão lendo-o sob as cobertas muito além da hora de dormir. Quando nos conhecemos (no tal café), Joanne Rowling estava ainda vivendo num péssimo apartamento alugado. Era sua primeira entrevista para a imprensa.

Hoje, sua fábula de um misterioso pequeno órfão que é resgatado de uma vida de negligência e abuso em um melancólico subúrbio para embarcar numa série de aventuras fascinantemente divertidas e inventivas na escola de magia (retratada na Escócia), a transformou numa superestrela internacional.

Hoje, Harry Potter e a Câmara Secreta, o primeiro de seis seqüências planejadas é o favorito para ganhar €10.000 pelo Prêmio do Livro do Ano Withbread. Há uma ironia aqui. Até 1996, literatura infantil competia junto com quatro outras categorias (romance, primeiro romance, poesia e biografia) pelo prêmio principal, mas foi colocado que um livro infantil em uma geração poderia levar o grande prêmio. Quando Câmara Secreta foi lançado ano passado, foi diretamente para o topo da lista dos mais vendidos, desbancando John Grisham, Terru Pratchett e Delia Smith. Os ditos crescidos estão malucos por Harry também e uma edição adulta do segundo livro está para sair em pouco tempo.

Ganhando um baú cheio de premiações, incluindo dois anos dourados no Prêmio Smarties Book Nestlé, não faz esforço para conter os nervos sobre o tormento de hoje a noite, aparecer ao vivo na BBC2. “Este negócio não deveria ser sobre ganhar prêmios, mas é um voto de confiança e se existe a mínima possibilidade de vencer eu fico terrivelmente nervosa”, ela diz.

A competição é, sem dúvidas, aterrorizante, talvez nem tanto para o já aclamado Robert Swindells ou a promissora revelação, James Riordan, mas para o terceiro finalista, David Almond.

O romance curto de David Almond, “Skellig”, para aqueles com mais de 10 anos de idade, tem um garoto encontrando um anjo com artrite em um péssimo estado numa garagem e é uma mistura de zoologia, patologia, mitologia, cirurgia neo-natal e William Blake.

Existem alguns pontos em comum entre os livros de Almond e Rowling. Ambos com vôos em geral (talvez uma fantasia universal infantil) e corujas, em particular. Ambos tem uma moral muito forte, sem ser pedante. Ambos tem grande apelo aos garotos.

Ganhar ou perder hoje a noite, isto não é o reconhecimento que Rowling mais valoriza. Os verdadeiros momentos mágicos aconteceram em encontros com seus jovens leitores:ver um garoto cego cuidadosamente sentir através da parte da primeira cópia em braille de Pedra Filosofal; escutar do garoto disléxico que nunca tinha lido um livro sozinho, conseguir ler sem ajuda alguma porque estava tão desesperado para saber o que aconteceria a seguir; confortar uma garotinha que conheceu no Festival do Livro de Edimburgo quando ela chorava: “Eu não queria que tivesse muitas pessoas aqui. Este é o meu livro.”

“Eu sei como ela se sentiu. Eu ainda não assimilei a novidade de estar numa sala cheia de gente que conhecem esses personagens”, diz Rowling.

No princípio era difícil viver com a novidade de ter dinheiro (de um enorme adiantamento americano) e tempo para escrever; Isto deu a ela seu primeiro período de bloqueio de escritor. A solução foi voltar para si própria de novo. “Eu vivia dizendo a mim mesma, não há porque escrever para outra pessoa senão eu mesma”.

Isso aconteceu quando ela estava retrabalhando no último quarto de Câmara Secreta. Tendo resolvido isso, ela sente que a seqüência é o melhor livro. “É um final mais dramático. Pedra Filosofal tem mais uma história linear conduzindo para um clímax. Câmara Secreta tem vários falsos clímax antes que Harry finalmente descubra o que ele deve fazer”.

Agora o terceiro livro, Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban, está pronto para publicação. Começa no aniversário de 13 anos de Harry e existe uma tentativa de fugir dos terríveis Dursleys. Outros detalhes da trama são altamente confidenciais. Ela já está trabalhando no quarto.

Rowling ainda vive e dorme Harry Potter, embora admita que no fim do livro sete ela possa estar pronta para uma mudança e tem várias idéias se formando em sua mente. Por enquanto, sua vida continua basicamente como antes: “Eu ainda levo Jessie (sua filha de 5 anos) para a escola e ainda limpando a toca do coelho. Ainda estou escrevendo quando posso”.

Embora o apartamento sinistro tenha sido rapidamente trocado por uma casa agradável em Morningside, ela ainda viaja de ônibus. Mas, em uma inversço da vida de seu herói, de vez em quando ela é magicamente retirada do subúrbio cinzento para um mundo bem diferente. Na sexta-feira passada, ela passou o dia com o ator Stephen Fry, que está narrando a versão em áudio de Harry Potter: “Isto não era uma coisa que costumava acontecer entre as viagens para Kwiksave!”

Há mais mágica nas lojas nesta quinta-feira quando “trouxas” interessados (Rowlinguês para não mágicos) são convidados para a plataforma 9 e 1/2 em Londres na Estação King’s Cross para a “transformação em reciclável” de Câmara Secreta. Se o local parece improvável, isso só serve para mostrar que você não leu o livro. Nós não vamos viajar pra Hogwarts, a escola mágica de Harry, mas a Railtrack prometeu conjurar o Expresso de Hogwarts.

Em sua introdução para “Skellig”, David Almond faz um comentário igualmente apropriado para sua concorrente nesta noite. “Escrever”, ele diz, “pode ser difícil, mas algumas vezes realmente parece algum tipo de mágica. Eu penso que histórias são coisas vivas: entre as coisas mais importantes do mundo”. Que a melhor mágica vença.

Traduzido por: Matheus de Almeida Barbosa em 07/03/2006.
Revisado por: Helena Alves em 30/05/2006 e Antônio Carlos de M. Neto em 08/03/2008.
Postado por: Fernando Nery Filho em 04/05/2007.
Entrevista original no Accio Quote
aqui.