Omelete entrevista o diretor e o produtor de Harry Potter
Por Mariana Della Barba e Marcelo Forlani, de Londres, para o site Omelete – 15/11/2002

 

Escola de Artes Guildhall, dia 25 de outubro de 2002. Num daqueles tradicionais dias chuvosos de Londres, o diretor Chris Columbus e o produtor David Heyman se reuniram ao elenco de Harry Potter e a Câmara Secreta para conversar sobre o lançamento do filme. O Omelete esteve presente e agora mostra como foi este bate-papo.

Foi mais fácil fazer o segundo filme, já que vocês não tiveram que explicar os personagens nem o contexto da história e foram direto para a ação?
Chris Columbus: Sim, foi bem mais fácil. Acho que todo mundo estava mais confiante um no outro. Eu me senti mais seguro com o fato do primeiro filme ter estreado muito bem no box-office, e saber que nós tínhamos as autorizações da autora e do estúdio. Eu sabia naquele momento que eu não seria mandado embora. (risos)

No segundo filme nós nos divertimos muito mais. Foi mais puxado, porque eu queria fazer um filme que fosse melhor que o primeiro, mas eu me senti muito mais confiante e sei que eles também estavam mais confiantes. Você pode ver isso na atuação deles. Desta vez, pudemos improvisar, o que não tinha acontecido antes.

Jason (Lucio Malfoy) criou uma fala. Ele chegou e sugeriu que queria se virar para o Harry e dizer “Espero que o Sr. Potter esteja sempre por aqui para salvar o dia”, o que era um ótimo discurso final, e Daniel falou “e seu dissesse ‘não se preocupe, eu estarei’ num estilo Clint Eastwood?”. E quando eles gravaram esta cena, ficou maravilhoso e nós acabamos usando tanto no filme quanto nos trailers.

David Heyman: Por um lado foi mais fácil fazer o segundo filme, mas logisticamente foi bem complicado porque Chris estava trabalhando ao mesmo tempo na edição do primeiro filme e na pré-produção do segundo. Eu não consigo pensar em outra pessoa que poderia fazer isso. E ainda jogar baseball na hora do almoço (risos). Foi incrível!

Vocês nem tiveram tempo pra descansar antes de começar a gravar o segundo filme. As reações do público ao primeiro filme influenciaram o trabalho?
Chris: Na verdade, não. Nem tivemos tempo para pensar nas reações, o que foi tão bom para as crianças quanto para nós, que estávamos fazendo o filme. A Pedra Filosofal estreou numa sexta e segunda estávamos no set filmando.

Quais as principais diferenças entre os dois filmes?
Chris: Nós sempre soubemos que A Câmara Secreta teria um estilo diferente. Desta vez usamos uma fotografia mais sombria. É mais um filme de aventura, com suspense e mais engraçado. Nós tentamos fazer um filme sobre o mesmo mundo, mas obviamente diferente. O primeiro filme teve 45 minutos de introdução, enquanto desta vez nós fomos direto pra história, o que faz uma enorme diferença.

David, quanto você espera que a audiência conheça da história?
David: Acho que o filme é autosustentável. Claro que, se você viu o primeiro filme, ou leu os livros, você vai ter algumas respostas que quem não conhece dificilmente vai entender. Mas os filmes funcionam por si só, não importa se você leu ou não os livros.

É bem visível que as crianças cresceram bastante desde o último filme. Vocês acham que eles conseguem interpretar estes personagens ao longo de sete filmes, se forem feitos?
David: No momento, todas as nossas atenções estão focadas apenas neste lançamento. Sobre o futuro, nós só temos a certeza de que os três estarão no próximo filme e a única coisa certa sobre o quarto filme é que nós estamos procurando alguém para escrever o roteiro.

Chris: Logicamente, vai demorar mais para filmar O Prisioneiro de Azkhaban do que demorou para fazer os dois primeiros, que foram filmados sem intervalo entre eles. E nos livros, como vocês sabem, as crianças também vão envelhecendo a cada ano em Hogwarts e elas podem fazer os papéis nos próximos filmes. Só depende deles. Eles têm que ver se vai valer a pena, se ainda haverá ânimo e energia para isso.

As crianças têm quase a mesma idade de seus personagens. Ainda vai demorar um ano até começarem as filmagens para o terceiro filme. Você não se preocupa com esta diferença?
David: Não. Você vê adultos interpretando papéis de crianças o tempo todo. Já vi caras de 25 anos fazendo papéis de moleques de 14 anos.

Vocês trabalharam em dois grandes filmes baseados em livros famosíssimos. Vocês acham que conseguiram atingir os objetivos que esperavam?
Chris: Na verdade, este foi o melhor momento da minha carreira de cineasta. A equipe inglesa foi a melhor com quem já trabalhei, os atores sempre foram completamente profissionais, sem estrelismo, mesmo sendo todos eles grande astros. Está sendo uma experiência maravilhosa. Eu infelizmente não posso fazer o terceiro por questões particulares. Eu não acho que conseguiria dar o mesmo sangue, suor e lágrimas que eu coloquei nestes dois filmes. Eu não conseguiria dar às crianças a mesma energia no terceiro filme e elas merecem isso. E estar envolvido com essas três crianças foi uma das melhores coisas que aconteceu na minha vida.

Você está precisando de uma folga…
Chris: Mas eu estarei envolvido no terceiro filme, produzindo. Vou trabalhar apenas em horário comercial, das 9h às 17h30. Espero! (risos)

Já há uma data de lançamento para o terceiro filme?
Chris: Já começamos a discutir isso, mas ainda não há uma data. Nós queremos gastar mais tempo na pré-produção e nos efeitos especiais, para que tudo pareça tão legal na tela quanto no livro e nos filmes anteriores.

Por que você escolheu Alfonso Cuarón?
David: Acho que embora Alfonso nunca tenha feito um filme do tamanho de Harry Potter, o trabalho dele o qualifica para o cargo. Y Tu Mamá También é sobre ser um adolescente. Alfonso tem um conhecimento muito aguçado sobre o que é ser um teenager. Y Tu Mamá é sobre a última fase da adolescência e O Prisioneiro de Azkahban é sobre o começo desta fase. Ele tem muita compaixão. Se você assiste à A Princesinha (A Little Princess, 1995), vê um diretor que dá asas à imaginação e também à magia – o que são qualidades tão importantes quanto o senso de humor. Acho que vai ser ótimo!

Você disse uma vez que um dos motivos pelo qual se tornou diretor foi porque queria trabalhar com atores e você se tornou meio obcecado com efeitos especiais trabalhando no primeiro filme. Você acha que estes dois projetos lhe trouxeram o equilíbrio ou acha que trabalhar com tanta tecnologia diminuiu a preocupação com os atores?
Chris: Nós tivemos três meses para trabalhar os efeitos especiais no primeiro filme. Para A Câmara Secreta, gravamos todos os efeitos digitais primeiro e tivemos nove meses [para trabalhar nas cenas]. Agora, acho que os efeitos estão muito melhores. Percebi que com a tenologia de hoje você pode fazer o que quiser. Isso abriu meus olhos como cineasta. Você pode colocar um personagem onde quiser, ou seja, sua imaginação está livre para qualquer coisa. Foi uma experiência maravilhosa.

Como vocês criaram o Dobby? Ele ficou um pouco mais feio do que tinha imaginado.
Chris: Dobby teve uma vida muito difícil, então não dava para fazê-lo bonitinho e bem cuidado. Ele usa a mesma roupa [uma fronha de travesseiro] a vida toda. Acho que a idéia ali era fazer a audiência gostar dele pelo seu interior.

Nós tivemos algumas preocupações na hora de criar um personagem totalmente digital. Tomamos cuidado para não acontecer o mesmo que com um outro personagem digital, que eu não vou falar o nome, mas era muito chato e ninguém gostava dele [N.E. Alguém pensou em outro personagem além do Jar Jar Binks? ;-)]. Nós queríamos um personagem que todo mundo pudesse adorar e torcer por ele no fim do filme. Parte dos créditos vão para a ILM (Industrial Light and Magic) que desenvolveu toda a imagem do personagem, pele, cabelos, etc. E boa parte do sucesso deve ir ao Daniel Radcliffe que conseguiu se concentrar numa bola cor de laranja e um palito. Muita gente no set ficou espantada com a forma como ele atuou. Eles falavam que nunca tinham visto uma criança atuar daquela forma.

Fale um pouco do trabalho que foi transformar o livro num roteiro.
Chris: Acho que o grande problema que tivemos foi cortar a cena do aniversário de morte do Nick Quase-Sem-Cabeça. Nós adoramos aquela seqüência no livro, mas achamos que ia atrapalhar o andamento da história, ia perder um pouco da força.

Eu sempre perguntava para as crianças no set qual era o livro preferido deles e A Câmara sempre foi muito citada. É um ótimo livro e tem ótimas partes que encaixam perfeitamente num filme, que são a cena das aranhas e a do Basilisco. Me sentia como uma criança de oito anos de tanto que não conseguia esperar a hora de filmar estas seqüências.

Vocês sentiram mais pressão e expectativa neste segundo filme?
Chris: Eu sofri muito até a primeira exibição. Estava preocupado que o filme estivesse muito assustador, mas nós mostramos o filme para 500 pessoas em Chicago e ninguém levantou a mão quando perguntamos se eles acharam o filme assustador. Todo mundo achou o filme muito legal e cheio de aventuras. Mostrei para a minha filha de cinco anos e ela adorou. Um amigo meu que tem 38 anos ficou com mais medo que ela. (risos)

Mas eu acho que se você tem um filho com menos de sete anos e quer levá-lo ao cinema, converse com ele antes. Aqui na Inglaterra, o filme tem um aviso, provavelmente o primeiro na história do cinema, dizendo que se você tem medo de aranhas, o filme pode ser um pouco forte demais.

Você tem de conhecer seus filhos. Se você acha que eles podem ficar com medo, ter pesadelos, converse com eles, deixe-os preparados para o que eles verão. Não é só empurrá-los para dentro do cinema. Existe uma razão para haver um sistema de recomendação de idade. Os pais tendem a ignorá-lo, mas acho que é um grande erro.

Existe muito em cima destas crianças, qual seu papel em não deixar nada acontecer?
Chris: Se você está neste ramo, o que tem que fazer é olhar para trás. Ver a história do Rock´n Roll, por exemplo, e pensar na vida de Elvis Presley e pensar “eu não vou acabar assim”. Eu sugeri para as crianças olharem para as vidas de outras crianças que vieram antes delas e ver onde elas erraram. E depois, olhe para quem se deu bem. Veja a vida de Jodie Foster, Ron Howard.

Meu conselho para essas crianças é: “quando você não está mais se divertindo, quando acha que isso aqui é só um emprego”, caia fora. Volte para seus amigos e família. Eu conheço os pais dessas crianças e acredito que elas estão muito bem seguras.