Dening, Penelope. “Criança Bruxa – Joanne Rowling”. Irish Times, 12 de setembro de 1998.

Seus livros infantis estão no topo da lista de mais vendidos em capa dura, superando as vendas de John Grisham. A criadora de Harry Potter, Joanne Rowling, conversa com Penelope Dening.

Joanne Rowling e sua criação, Harry Potter, que descobre ao fazer 11 anos que é um bruxo e é levado à Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts. “Você leu o novo Harry Potter?” perguntou Huw, que cuida do meu estacionamento. Harry Potter não era um autor ao qual eu fosse familiar, admiti. “Não,” ele riu. “Harry Potter, o bruxo.” Ele estava falando sobre um livro infantil, na verdade, de dois livros infantis. Ele acabara de ler o novo, Harry Potter e a Câmara Secreta. Para seus filhos, entenda. Embora ele e sua esposa tenham quase caído no soco para ver quem leria a história de dormir a cada noite.

“Surpreendente,” continuou. “A maioria de livros sucessores não são tão bons quanto o primeiro. Mas este é ainda melhor.” Harry Potter arrebatou pela primeira vez a cena literária infantil no ano passado, quando Harry Potter e a Pedra Filosofal, escrito pela autora de primeira viagem Joanne Rowling, venceu o prêmio Smarties – o prêmio Booker para aqueles que escrevem para crianças. Ele prosseguiu e vendeu fenomenais 70.000 exemplares. Então, neste verão, veio a seqüência, Harry Potter e a Câmara Secreta, que foi direto ao topo da lista de mais vendidos em capa dura, ultrapassando John Grisham, Terry Pratchett e Delia Smith.

Em seu 11º aniversário, o órfão Harry – cuja vida até então tem sido uma extenuante infelicidade com sua tia, tio e o nocivo primo Duda – descobre que é um bruxo e é levado à Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts. “É a fantasia preferida de todos de acabar sendo muito melhor do que seu passado,” explica a escritora Joanne Rowling numa tentativa de explicar a popularidade que atravessa as gerações dos livros. “Eu passei por esse período, como a maioria das crianças, eu acho, passam, de pensar ‘estas pessoas não podem ser os meus pais'”.

O genial da série é que ela combina a estrutura da história escolar com qualquer fantasia de infância que você possa imaginar. A invenção de Rowling é fenomenal: porta-retratos em paredes que se mexem e falam, as cartas são entregues por corujas, as aulas incluem Poções, Feitiços, Transfiguração e Defesa Contra as Artes das Trevas. Os pupilos dormem em camas de dossel, o material escolar inclui varinhas (de diferentes tipos e tamanhos, naturalmente) e vassouras, embora seu principal uso seja para o esporte inter-casas, o Quadribol. Muitas das idéias de Rowling são pura invenção, como o Quadribol, cujas regras são tão complexas quanto o lacrosse misturado ao futebol americano (a Irlanda, Rowling me conta, está a ponto de se tornar a campeã mundial). Mas ela também tira um pouco do poço do folclore e das fábulas: as mandrágoras crescem em vasos de planta (transplantá-las é um negócio perigoso: o grito da mandrágora pode ter conseqüências terríveis). Três deles são as fênix, dragões e unicórnios.

Entretanto, como em qualquer escola, há o lado ruim: provas, tiranos e professores que parecem odiar você. Os livros transbordam de personagens com nomes estranhos e maravilhosos e as tramas são tão complexas e cheias de ação quanto qualquer suspense adulto. “Acho que as pessoas subestimam demais as crianças,” diz Joanne Rowling. “Só porque elas gostam de coisas um pouco menos elaboradas não quer dizer que não gostem de coisas elaboradas. Isso me atingia como uma ordem para simplificar. Basicamente eu apenas o escrevi para mim. Eu realmente me sinto inocente agora, no sentido de que eles têm vendido tão incrivelmente bem de uma forma que nunca esperei que fossem fazê-lo. Não esperava que eles tivessem nenhum apelo principal. Achava que era um livro do qual as pessoas obsessivas poderiam gostar. Você pode quase enganchar os detalhes e colecionar informações no mundo mágico”.

Talvez a coisa mais extraordinária quanto aos livros de Harry Potter é que, logo no início, Joanne Rowling os concebeu como uma série de sete. Em 1990, estava em um trem que se atrasou quando a idéia lhe veio repentinamente. “Essencialmente, era a idéia de um garoto que não sabia que era um bruxo, tinha uma vida infeliz, muito infeliz, até que fora levado a uma escola de bruxo. Mas o que realmente me deixou pensando no trem era como uma escola bruxa seria. Fiquei sentada por horas e apenas pensei, pensei e pensei. Quando cheguei em casa, comecei a escrever e, literalmente, não tenho parado desde então”.

Pouco depois, ela se mudou para Portugal para ensinar inglês (sua graduação era em Francês e Literatura Clássica), onde conheceu e se casou com um jornalista e teve uma filha. Ao mesmo tempo, ela ainda escrevia – idéias e linhas de narrativa que formariam a base de toda a série. Foi apenas quando o casamento se rompeu e ela voltou com sua filha de quatro meses a Edimburgo para ficar perto de sua irmã que ela as mostrou a alguém. Ela não fazia idéia de onde tirara a confiança de planejar uma série de sete livros quando jamais tivera nada de nenhuma descrição publicada.

“Acho que foi uma coragem forçada pela situação. Minha vida era absolutamente terrível quando cheguei à Escócia. Eu estava vivendo em uma gloriosa kitchenette e tinha um bebê recém-nascido. Não tinha qualquer possibilidade de encontrar uma creche. Enfermeiras estatais eram apenas para crianças no registro de risco. Pensei, nunca vai ficar melhor do que isso. Pensei: quando estiver fora e trabalhando de novo, não terei tempo algum”. Ela escreveu (à mão) em todos os lugares que pôde – de preferência no café local onde era quente para ambas ela e o bebê no carrinho. Um ano depois, o primeiro livro estava sendo leiloado em Nova Iorque (ele foi vendido por US$100.000). Três anos mais tarde, o contrato de um filme está a ponto de ser assinado. As comparações têm sido inevitavelmente feitas com Roald Dahl. Mas a anarquia de suas histórias não existe na obra de Rowling. Sua inspiração, se for alguém, é C.S. Lewis. Os livros de Harry Potter estão repletos de moralidades nobres. “O cerne moral do primeiro livro teve muito a ver com a minha situação com a morte da minha mãe. Embora não tenha percebido isso até que escrevi o segundo rascunho”. A mãe de Rowling morreu oito anos atrás após muitos anos sofrendo de esclerose múltipla. No primeiro livro, Harry descobre um espelho mágico que reflete o que seu coração mais deseja. O que ele vê são seus pais, ambos mortos há muito.

“Não acredito que as crianças vão captar tudo. Mas não acho que isso seja um problema. Meus livros favoritos são baratos e estão caindo aos pedaços porque sempre volto a eles. Se as pessoas voltam aos livros e descobrem mais neles, isso tem de ser bom. Será como encontrar outro doce no pacote”.

Harry Potter e a Pedra Filosofal (Bloomsbury £4.99) e Harry Potter e a Câmara Secreta (Bloomsbury £10.99) por Joanne Rowling.

Traduzida por: Renan Lazzarin em 06/12/2008.
Revisado por: Renata Grando em 15/12/2008.
Postado por: Vítor Werle em 18/12/2008.
Entrevista original no Accio Quote aqui.