JOHN WILLIAMS
Por Thanos Fourgiotis

Não, John Williams não se sente desapontado que, apesar da sua dupla nomeação, não ter ganho o Oscar para Melhor Composição Original (“JFK”) nem Melhor Música Original (“Hook”). Com quase sessenta anos, o compositor que nos deu momentos inesquecí­veis, considera-se um “homem com sorte”: Quatro Oscars, quinze Grammys e música para quase oitenta filmes é já muito para uma carreira de um compositor que começou em 1961. Hoje ele está no coração de todos os amigos do cinema e no coração de Steven Spielberg. Ele fala sobre “Hook”, Steven Spileberg, música para cinema e recorda velhos associados e se calhar por de trás das suas frases você descobrirá a incrí­vel personalidade de um homem calmo. A personalidade que nenhum Oscar será capaz de recompensar.

John Williams: Como deve saber, os nomeados para o Oscar de Melhor Composição são escolhidos pelos membros da Academia que são compositores de música. Mas os vencedores são votados por todos os membros da Academia e habitualmente eles escolhem recompensar o compositor cuja música eleva o filme. A experiência mostrou que, quando um musical é nomeado para Melhor Composição Original então os membros da Academia… respondem e premeiam-no. Algo desse gênero aconteceu este ano. Eu fui nomeado para um Oscar pelo meu trabalho em “JFK”, que é um filme dramático. Mas ao contrário, o Oscar foi para “Beauty and the Beast”, que tem, claro, música maravilhosa, mas mais leve. É música de um musical. Eu compreendo perfeitamente que era difí­cil para os membros da Academia recompensar uma composição séria e dramática, como a de “JFK”. Escolher “Beauty and the Beast” estava mais próximo da tradição de Hollywood e menos arriscado para todos!

CM: Então não ficou perturbado…

JW: De modo nenhum! Não se esqueça que eu estou habituado a escolhas dessas. 30 nomeações para um Oscar são demais para um compositor, e a única coisa que eu posso dizer é que eu estou feliz que os membros da Academia tenham preferido a minha música tantas vezes.

CM: Mas também não ganhou o Oscar para Melhor Música.

JW: Eu não esperava ganhar! Eu estou numa posição para saber como certas coisas funcionam em Hollywood e por isso eu não tenho falsas esperanças.

CM: Para Hook você associou-se com o letrista Leslie Bricusse para três canções. Eu sei que ele é alguém que você aprecia, e também já se tinha associado com ele muitas vezes no passado. Mas há uma grande confusão com ele, especialmente aqui na Grécia. Importa-se de falar sobre ele?

JW: Quando diz confusão, quer dizer que muita gente pensa que ele é uma mulher? (gargalhadas)

CM: Sim. Isso também!

JW: (rindo) Eu pensei nisso! A Grécia não é o único lugar onde isso acontece… De forma a acabar com qualquer mal intendido, eu devo dizer que Leslie Bricusse é um sócio excepcional, um cavalheiro britânico que tem feito muitas coisas maravilhosas. Nos anos sessenta, ele escreveu letras e músicas para vários musicais.

CM: Alguns deles chegaram aos Oscars.

JW: Sim. Eu conheci o Leslie dois anos mais tarde como diretor musical do filme “Goodbye, Mr. Chips” com Peter O’Toole. Ele escreveu as letras e música para o filme e nós concorremos juntos para um Oscar em 1969. Claro que não ganhamos. Nós não podí­amos competir com “Hello Dolly” com Lenny Heiton e Leslie Newman que se mostraram invencí­veis… Leslie também se associou com outros compositores famosos como John Barry. Considerando-nos, após a muito bem sucedida colaboração em “Home Alone” eu decidi pedir-lhe para escrever as letras para as canções de “Hook”. Algo que ele aceitou com um grande prazer.

CM: De que forma é que abordou “Hook”?

JW: Eu abordei-o como um conto de fadas e acho que estava certo!

CM: E o resultado foi música de “sonho”?

JW: (gargalhadas) Eu espero que sim! Eu devo dizer-lhe que “Hook” é o filme típico em que Steven usa a sua imaginação. Ele não lida com o mundo real, mas com o mundo da sua imaginação. Aquele que nós gostávamos que existisse e que apenas as crianças tem o privilégio de sonhar e criar. Esta área, a área da fantasia, é a melhor que pode existir para a música. Porque apenas ali a música pode criar aquilo que está tentando fazer, transferir as pessoas para outro local, desligá-las de tudo humano, e banal. Compor música para filme como “Hook” é um presente maravilhoso. O compositor não tem mais de lidar com restrições que ele provavelmente teria num filme mais realí­stico. A música está sempre presente no filme. A orquestra continua a tocar e o ouvido do ouvinte pode aceitar o bombardeamento de música mesmo se o que os olhos vêem não concorda com o que os ouvidos estão ouvindo. A música neste tipo de filme tem um papel muito importante porque apenas a música pode fazer o público acreditar no que vê. Apenas a música pode fazer da fantasia, realidade. Por exemplo, como pode o público acreditar que Robin Williams está voando, se a música que acompanha o filme não ajudar. Por isso, este é o axioma em que eu me baseei para o que a minha música tinha que fazer (e eu como compositor) em “Hook”. Eu usei música que também podia ser chamada “teatral” ou de “bailado”. Quando Peter Pan consegue voar, a orquestra toca música que nos recorda de uma dança ou bailado muito veloz. O mesmo na sequência da “Ultimate War”. A música segue o ritmo do filme, sublinha a ação. Alguém faz um movimento intenso e a orquestra segue-o com ênfase, como as cordas. Outro está sonhando e a orquestra descreve esse sentimento de sonho. Em outras palavras, a minha música para “Hook” não se afasta da dos desenhos animados, onde a música tem de estar amarrada ao filme. Tudo isto, claro, relativamente à concepção da idéia para o papel que a música tinha no filme.

CM: Compôs a música de “Hook” depois das filmagens ou começou antes?

JW: O que eu faço habitualmente com o Steven é ver o filme depois de montado. Nós temporizamos as partes do filme que precisam de música com precisão absoluta e discutimos o papel que a música tem que desempenhar em cada cena. Quando nós gravamos no estúdio, eu exijo que a gravação tenha lugar enquanto eu estou vendo o filme num écran. A orquestra está à minha frente e eu estou à frente do écran.

CM: Qual é que considera ser a sua melhor composição para um filme de Steven Spielberg?

JW: Essa é uma questão difí­cil, muito difí­cil (pensa). Como eu sempre digo, a música de cada compositor para cinema tem apenas partes muito frágeis. Vai haver sempre momentos ou partes do filme de que eu me sinto orgulhoso, e outros em que desejava ter feito melhor. Pessoalmente, eu nunca estou totalmente satisfeito com a minha música. Eu penso que das minhas colaborações com Steven, a música de que gosto mais é a de “Close Encounters of the Third Kind”. Não que eu ache que esta música é perfeita ou não poderia ser melhor em algumas partes, mas como o filme era tão mágico, tão pioneiro e inspirado, deu-me a oportunidade extraordinária para compor música “especial”, mesmo nas fronteiras limitadas da música para cinema. Uma oportunidade que se tem poucas vezes na vida. Eu penso que algo idêntico aconteceu em “E.T.”, mas não tão intensamente. Por isso é que a minha preferência se inclina para “Close Encounters”.

CM: E um filme de Spielberg com que tenha ficado insatisfeito com a sua música?

JW: Para lhe dizer a verdade… Eu não sei! Nós fizemos tantos filmes juntos que é difí­cil dizer que eu fiquei desapontado com algum. Talvez eu tenha algumas dúvidas sobre o primeiro filme que fizemos juntos, “Sugarland Express” em 1973-74. É um filme muito bom, mas não me foi dada a oportunidade para desenvolver a minha música tanto como eu queria.

CM: Não se sente assustado que depois de uma colaboração tão longa com Spielberg, brevemente fiquem saturados?

JW: Colaborações são como casamentos! Algumas vezes eles têm sucesso, outras vezes não. Às vezes um par habitua-se a viver junto e os interesses de cada um chocam-se. Às vezes em pequenas brigas e… infidelidades o interesse é “renovado” ou uma separação final ocorre. Considerando a minha longa colaboração com Spielberg, eu devo dizer, nós não estamos cansados um do outro. Nós somos muito bons amigos. Nós não somos só associados, mas algo mais. O interesse de um pelo outro é renovado a toda a hora, a minha colaboração com Spielberg não me proí­be de associar com outros realizadores. Por isso eu posso compor música para os filmes de Alan J. Pakula, Ron Howard ou Oliver Stone! E eu tenho tempo suficiente disponível durante essas relações para encontrar novamente Steven Spielberg com a sensação de que algo novo está começando, que uma nova aventura começa. O melhor antí­doto que se pode encontrar contra a monotonia.

CM: Nos últimos anos, jornais, revistas e rádio falaram mais de música para cinema. Os compositores dão entrevistas e há álbuns com trilhas sonoras que tocam a “grande multidão”. Está consciente deste fato e qual é a mensagem, na sua opinião?

JW: Eu vou usar o termo “popular” para descrever aquilo que eu acredito. Sim, é um fato que a música para cinema não está na margem, aonde foi colocada, e está se tornando mais e mais popular. Lembre-se que nos anos 30, no iní­cio dos filmes falados, a música para cinema era muito popular também. Hoje nós revivemos essa situação. Mais pessoas estão interessadas, compram e ouvem música para cinema. A música realmente interessante é desenvolvida e reconhecida ao mesmo tempo. Eu fico muito feliz por isso, não apenas como compositor, mas como um simples ouvinte. Mais ainda, me sinto satisfeito que compositores importantes, estão se voltando para os filmes e já não olham para a música para cinema como secundária ou sem valor.

CM: O que quer dizer que a música para cinema vai ser ajudada a tornar-se ainda melhor…

JW: Claro! Porque, enquanto que no passado, muitos compositores eram mercantis, música que não valia a pena artisticamente para eles. Agora que se percebem que muitas peças de música importantes são famosas através do cinema, eles mudaram a sua opinião. Todo mundo acredita agora que o cinema é a mais forte e popular forma de arte no mundo inteiro. E para os compositores é apenas uma maneira de compor música com “valor”. Não é por acidente que orquestras famosas incluam nos seus programas composições para cinema. Nem que muitos filmes tenham música sinfônica “pura” como fundo! Por isso, eu acredito que hoje, nós temos mais compositores importantes que estão trabalhando para o cinema e isso é positivo, tanto para a música para cinema, como para a música em geral.

CM: Dentre os novos compositores que descobrimos no cinema, há alguns que aprecie?

JW: Há uma série de compositores extraordinários aqui em Los Angeles. Verdadeiros trabalhadores do cinema como James Horner, James Newton Howard ou George Fenton. Há outros na Europa ou Grécia, que eu ignoro. Eu acredito que o talento existe em todo o lado.

CM: Quando era um estudante, podia ter imaginado que um dia ia se tornar no famoso compositor de cinema, John Williams, que todo mundo conhece e aprecia?

JW: Certamente que não! Quando se é jovem, é muito difí­cil prever para onde a vida nos leva. Aquilo que eu repetia para mim mesmo era que não haveria maior recompensa para mim do que seguir o caminho que já havia escolhido, o caminho da música. Não interessa quantos sacrifí­cios tinham de ser feitos. E eu penso que os fiz. Por isso, tive sorte!