Ahuja, Anjana. “Encontro dos romances HP”. The Times (Londres), 27 de junho de 2000.

Bryony Evens foi a primeira a descobrir o heroi de J.K. Rowling.

Bryony Evens puxa um livro de Harry Potter de sua bolsa e o entrega a mim, radiante. Em uma página interna tem garranchos extravagantes, diagonais em tinta preta: “Para Bryony – que é a pessoa mais importante que eu já encontrei em uma sessão de autógrafos e a primeira pessoa a ver mérito em Harry Potter. Com um agradecimento imenso. J.K. Rowling”.

O “imenso” foi sublinhado quarto vezes, mostrando a contribuição que Evens fez para esse fenômeno em particular. Pois é ela quem, enquanto trabalhava na Agência Literária Christopher Little como gerente, abriu a caixa postal em uma manhã de 1996 para voltar suas atenções para um envelope preto. Harry Potter e seus camaradas bruxos estavam perto de serem soltos no mundo exterior, e Evens foi a primeira pessoa a cair sob seu encanto.

Era obviamente um livro infantil, algo com o qual a agência normalmente não trabalhava, mas esse intrigou Evens. “Tinha uma carta de apresentação, uma sinopse e três capítulos de amostra, que é exatamente o que nós pedimos às pessoas para nos mandarem”, ela diz. “Eu li a primeira página e pensei que soava realmente bom, então eu deixei de lado para ler depois. Eu mostrei à leitora que estava lá aquele dia e ela também gostou muito”.

Depois de checar com seu chefe, ela pediu que o resto do manuscrito fosse enviado ao escritório. “Quando ele chegou, eu não conseguia soltá-lo”, diz Evens. “Eu já tinha decidido que, mesmo se nós o rejeitássemos, eu ia terminar de ler para matar minha curiosidade. Eu lembro de fazer uma lista mental do que era bom nele – ele tinha a história da escola, tinha a história do órfão vivendo com a família postiça malvada, tinha bruxas, feiticeiros e magia, que é sempre fantástico, e era uma história de detetive realmente boa, com uma virada no final. E não havia nada que me tivesse feito rir tanto na primeira leitura desde Vida Encantada de Diana Wynne Jones.

“Chris (Little) passou uma noite lendo e nós fizemos uma lista de coisas que pensamos que não eram fortes o suficiente, e então nós escrevemos para ela. Eu achei que devia haver mais de Neville (um dos amigos de Harry) porque ele era uma personagem muito amável, e Chris queria saber mais sobre Quadribol (um jogo de bola). Joanne na verdade tinha tirado as regras de Quadribol porque achou que tinha ficado muito técnico. Mas não havia praticamente mais nada”.

Rowling escreveu de volta: “Isso é brilhante porque eu gosto de Neville, e, que ótimo, eu posso colocar as regras de Quadribol de volta”.

O manuscrito revisado de Harry Potter e a Peda Filosofal foi copiado e enviado a diversas editoras, inclusive Penguin, TransWorld, HarperCollins e Bloomsbury. Bloomsbury o aceitou – e o resto é história.

Evens, 30, é tranquilamente modesta sobre seu papel na descoberta de Harry Potter. Tão modesta que ninguém fora sua família e amigos sabia que foi ela a primeira pessoa no mundo editorial a conhecer Harry Potter (ela saiu da agência logo depois).

Ela parece um pouco envergonhada de que a informação tenha vazado anos depois, e horrorizada de ser descrita como a mulher que descobriu Joanne Rowling. “Mike me roubou”, ela diz bem humorada, se referindo ao editor Michael O’Mara, de quem ela virou assistente no ano passado, e que espalhou o segredo sobre sua empregada para um executivo da Times. “Eu odiaria ser vista como oportunista”.

Evens diz que o produto Harry Potter era tão bom que alguém o teria percebido. “É só que ele veio para nós primeiro. Parece tão óbvio agora, e parecia óbvio para mim na época, que era um livro realmente bom. Eu pensei que ele podia ser grande, mas não me ocorreu que seria tão grande assim”.

Evens agora é uma das maiores fãs de Harry e ela vai à estação de trem King’s Cross em Londres no dia 8 de julho, a data de lançamento do quarto livro, Harry Potter and the Doomspell Tournament (“Harry Potter e o Torneio Amaldiçoado”, em tradução livre), para acenar adeus ao Expresso de Hogwarts.

Ela não ficou consternada por nunca ter recebido crédito por sua contribuição. “Se eu tivesse continuado lá, eu me arrisco a dizer que teria ficado rica e famosa”, diz Evens com uma risada. “Eu suponho que teria ficado muito mais envolvida com ele. Mas eu quis seguir em frente. Muitas coisas estavam acontecendo. Eu tinha trocado de namorado, mudado de casa”.

Evens depois trabalhou por três anos numa imobiliária. Sua única indulgência literária neste período foi quando ela ligou para a Bloomsbury quando o primeiro livro saiu para pedir uma cópia. Ela não foi convidada para o lançamento.

Ela finalmente conheceu Joanne Rowling em 1998 – na sessão de assinaturas no Festival Literário Cheltenham. “Minha tia comprou ingressos e nós pegamos duas crianças emprestadas para não parecermos estar no lugar errado”, lembra Evens. “Depois, durante os autógrafos, eu disse a ela quem eu era e ela pulou e me deu um abraço na frente de todas aquelas crianças.

“Ela sabe exatamente onde está indo com isso tudo. Ela tornou as entrevistas com a imprensa em uma arte fina. Ela tem a última página do último livro trancada em um cofre. Ela sabe que está escrevendo sete livros e que é isso”.

Evens é organizada, modesta e não particularmente ambiciosa. Contentamento é ter um livro em sua bolsa. Uma graduada em literatura inglesa, ela admite ser obcecada com palavras e feitiços. Além de escrever cartas, ela revisa manuscritos. “No fim da Clapham High Street, nós temos uma sapataria Shoes For All Occassions e uma cafeteria Fully License”, ela diz, estremecendo. Ela até repreende os lojistas por essas placas.

“Esse tipo de coisa realmente me aborrece. Foi por isso que eu voltei ao ramo das editoras. É a minha chance de fazer algo pela língua inglesa”. Ela também têm colecionado livros de descobertas como The World’s Stupidest Signs (“As Placas Mais Estúpidas do Mundo”, em tradução livre).

Evens não espera um contato maior com a criadora de Harry Potter. Ela só parece grata e silenciosamente orgulhosa por estar envolvida no começo. São as palavras e os livros e as histórias que são seu primeiro amor, e é por isso que ela trocou as placas de arrendamento por pilhas de papéis mais uma vez. Evens ama principalmente livros infantis – seus autores favoritos incluem Tolkien e Dahl – mas ela não deseja comissões ou escrever livros: “Eu sou muito mais feliz trabalhando com as palavras de outras pessoas e eu certamente não quero ser a próxima J.K. Rowling”.

Traduzido por: Patrícia Abreu em 24/01/2009.
Revisado por: Renata Grando em 26/01/2009.
Postado por: Vítor Werle em 26/01/2009.
Entrevista original no Accio Quote aqui.